segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Um pensar que se impõe

Acordei de repente, mais uma vez, a meio da madrugada escura, sem motivo aparente para este súbito despertar. Não tinha os olhos turvos de sono nem o raciocínio lento de quem é arrancada dum sonho profundo, não bocejei nem procurei anichar-me comodamente na posição retorcida do costume para voltar a dormir. Já conhecia este momento.
Mortifica-me a noite neste quarto claustrofóbico e atulhado de memórias. Durante o dia, rodeada de gente que aparenta correr de lugar em lugar com propósito fundamentado, não custa ser só mais uma: basta expor o corpo, que a alma se esconde automaticamente. Mas, de noite, não há o cheiro hipnótico da multidão e do fumo dos carros, o ruído demasiado alto de vozes que a outras se sobrepõe e de máquinas cinzentas, não há turbilhão de cores, aromas, sons, toques…não há nada que encha a cabeça e iluda o pensamento.
Acordo só, tal qual me deitei, alheia às sombras difusas e ao silêncio mórbido. Acordo, sento-me de costas encostadas à cabeceira da cama e pernas encolhidas entre os braços e resigno-me: não há como negar alguns minutos de consciência à mente, só eu comigo, reflexo erróneo num espelho que tanto distorce.