quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Nevoeiro em mim

O silêncio abateu-se em mim com o denso nevoeiro da tarde. O branco líquido que se espalhou e cobriu o chão apenas deixava a descoberto pontas de telhados, que me pareciam uma cama de pregos. Foi como se o céu tivesse derramado um gigantesco pacote de leite acabado de sair do frigorífico, mesmo por cima da minha cabeça. De qualquer maneira, senti que foi também ele que, enquanto me envolvia, levou para longe as palavras, os outros e a paz.
Senti-me isolada e triste desde aí, mas só que nunca, sem porto onde me abrigar. Rodeie-me de livros, de palavras sábias que sempre me acompanham…mas as histórias pareciam ocas, as frases vazias de sentido, as personagens distantes e frias. Deambulei à deriva por entre os móveis e a rua, mas caminhava no meio de sombras, sem enxergar, e a névoa tinha o dom de, telepaticamente, me bloquear.
Não me apetece escrever. Não, de todo, não é isto que quero. Desta vez, ao contrário das outras, quanto mais escrevo mais se aperta o nó na minha garganta. Mais ténue fica a linha entre a pouca sociabilidade e a solidão. Cada palavra que escrevo torna mais funda a ferida que se instalou em mim. E, no entanto, não tenho mais nenhum sítio onde ficar que não nestas páginas que, ainda que molhadas pelas lágrimas que escorrem do meu rosto, são o mais perfeito espelho de mim, e único lugar onde poderei, eternamente, descansar em paz.

2 comentários:

Rita A. disse...

Apesar de espelhar dor, o texto está muito bem escrito como sempre. Está muito bonito (bom tu entendes aqui a utilização deste adjectivo). Beijinho grande

Graça Pires disse...

Quando as palavras são o lugar que redime a nossa solidão...
Muito bom o teu texto, Rita.
Um beijo.