Paulo chegou á sua casa bastante contente com a colheita da noite. Há meses que tudo o que conseguia era uma média de duas bonecas por semana, roubadas discretamente a miúdas histericamente felizes. “Nem sabem do que riem!”, pensava ele das pequenas criaturas irrequietas, de riso fácil e olhar brilhante. Crianças repugnavam-no. De resto, adultos também. A humanidade era uma massa homogénea, não havia alma que se safasse a tal. Mas os mais pequenos, de tão frágeis, necessitados e, ainda por cima, felizes, eram-lhe totalmente insuportáveis. Talvez por isso tivesse tomado a decisão de os assaltar e ouvir, ao longe, chorar as suas pequenas perdas. Por isso e porque precisava das bonecas, claro. Meteu a chave à porta e entrou.
Durante o caminho ele nem se apercebera do pequeno vulto que o seguia, tiritando de frio e de medo. Andou atrás daquele homem saído directamente das sombras durante meia hora e já julgava que estava perdida e que ele não tinha um destino, quando por entre as árvores dum pequeno bosque que existia na periferia da cidade viu os contornos ténues de uma casa térrea. Marta ficou ainda mais assustada quando viu o lugar onde aquela perseguição a levara. A casa era medonha. Não estava pintada, e por entre o tijolo e o cimento cresciam ervas. Do telhado não se sabia se as telhas tinham saltado ou se este simplesmente fora feito sem elas, tal era a quantidade que faltava. Não havia jardim, vedação, nem nada que se parecesse. A casa surgia, como por artes mágicas, no meio duma clareira, e a dimensão do espaço era restringida às paredes da mesma. A tremer mais ainda mas disposta a não abandonar aquele lugar sem a sua boneca, Marta escondeu-se atrás de uma árvore e espreitou o que se passava do interior da casa, através da luz acesa no interior vista por uma pequena janela, de vidro tosco quebrado.
Durante o caminho ele nem se apercebera do pequeno vulto que o seguia, tiritando de frio e de medo. Andou atrás daquele homem saído directamente das sombras durante meia hora e já julgava que estava perdida e que ele não tinha um destino, quando por entre as árvores dum pequeno bosque que existia na periferia da cidade viu os contornos ténues de uma casa térrea. Marta ficou ainda mais assustada quando viu o lugar onde aquela perseguição a levara. A casa era medonha. Não estava pintada, e por entre o tijolo e o cimento cresciam ervas. Do telhado não se sabia se as telhas tinham saltado ou se este simplesmente fora feito sem elas, tal era a quantidade que faltava. Não havia jardim, vedação, nem nada que se parecesse. A casa surgia, como por artes mágicas, no meio duma clareira, e a dimensão do espaço era restringida às paredes da mesma. A tremer mais ainda mas disposta a não abandonar aquele lugar sem a sua boneca, Marta escondeu-se atrás de uma árvore e espreitou o que se passava do interior da casa, através da luz acesa no interior vista por uma pequena janela, de vidro tosco quebrado.
***
Paulo acendeu a luz, pousou a mochila na sua poltrona esfarrapada e abriu a porta do frigorífico. Nada comestível e ainda menos no prazo, como de costume. Tirou uma cerveja já a meio que se encontrava entre uma sandes em pão bolorento e um prato com vários caroços de maçã mal aproveitados. Bebeu-a sem parecer reparar na, ou lamentar a, imundice em que vivia.
Quando acabou atirou-a para o chão, e olhou, sorrindo, a mochila ainda cheia que o olhava da poltrona. Uma das bonecas tinha ficado de cabeça de fora, quando ele fechara a mochila. Olhou com desprezo para aquele despojo de feições humanas sorridentes que, de olhar vazio, o fitava. Loira, de longos cabelos encaracolados, tez branca imaculada e olhos verdes, grandes, a boneca era muito parecida com a sua mãe. “Puta.” pensou, afugentado a vaga lembrança que o invadira. Sentiu de imediato as fortíssimas dores de cabeça e reviveu os duros momentos que tinham para sempre mudado o rumo da sua vida.
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