quarta-feira, 16 de abril de 2008

Lobos enjaulados


Dou comigo a sorrir frente a algumas situações.
“Há lobos enjaulados nas máscaras que somos”, pode ler-se na parede na casa de banho feminina do 2º andar da ESCS.
Não faço a menor ideia de quem isto escreveu. Tão pouco sei quando o fez, ou porque razão. Mas não deixa de ser estranho pensar que uma das frases mais sensatas e tocantes que já li esteja rabiscada num sanitário público, local de “entra e sai” de todo o tipo de (teoricamente) miúdas, talvez mulheres. Local, também, de “entra e sai” de outro tipo de substâncias, igualmente comuns mas menos banalizadas. No fim de contas encontro mais conteúdo num cubículo destinado a colher necessidades básicas (e outras mais secundárias mas de menor relevo) do que na grande maioria das restantes salas de estudo desse edifício, e de muitos outros a ele semelhantes.
Seremos todos poetas de casa de banho? Será que só em locais como este, em que a nossa intimidade fica preservada por três paredes, um chão, uma porta e (nem sempre) um tecto, será que só quando nos sentimos a sós connosco somos capazes de revelar essa máscara que já nem temos, mas somos?
E o lobo enjaulado, fica onde? No brilho líquido do olhar cauteloso? Todos sentimos a presença incómoda dessa alcateia acorrentada, quando na multidão estamos. Todos ouvimos o eco do seu uivo na raiva das insinuações proferidas, na avidez das traições consumadas, no medonho eclodir da violência. E será só nas minhas costas que jazem, imponentes, as cicatrizes dos fundos golpes feitos pelas suas garras afiadas?
A verdade é que há lobos enjaulados, sim. Lobos cada vez mais selvagens. Cada vez mais desesperados, mais ansiosos por rebentarem as correntes que os condicionam, cada vez mais animais. E a verdade, também, é que continuamos a ser máscaras. Máscaras camaleão, amorfas. E, se tu que me lês me entendes, sabes que os lobos não aguentarão muito mais esta biosíntese fantoche que as máscaras impõem.

4 comentários:

Anónimo disse...

Caga e deixa-te de filosofias.

Pergunto-me eu, João Miguel Angélico (se é que ainda te restavam dúvidas), quanto tempo ficaste tu na sanita a meditar sobre tal frase para chegares a um pensamento tão profundo? E por falar em profundo, profundo será também a 'necessidade básica' que terás deixado em tal cubículo.

Rita Mendes disse...

Se não fosses o João Miguel Angélico e eu não conhecesse essas teorias, estarias daqui para a frente lixado! xD (e não, não restavam dúvidas)

Anónimo disse...

Podes crer! Todos nós temos um lobo cá dentro e a nossa jaula não está tão segura quanto possamos pensar...

Rita Mi. disse...

vim espreitar o teu blog e não pude deixar de comentar este artigo. Quando entrei nesse cubiculo da casa de banho entre o 1 e segundo andar da ESCS (pobres casas de banho nem andar definido têm) não pude deixar de sorrir ao ler essa frase. É tão verdadeira. Escreves bem pá.

Da colega caladita, também ela Rita, lá ao pé da janela =P

PS: Ignora o que o Trindade já te ensinou e não ligues aos erros de pontuação que possam existir neste comentário